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  • Foto do escritorFrederico Aburachid

Licenciamento Ambiental em xeque

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Foto: Corpo de Bombeiros/MG


Nos termos da Resolução CONAMA nº 237, de 1997, o licenciamento ambiental é o procedimento administrativo pelo qual o órgão competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais , consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental.

A mais recente tragédia da Mina do Córrego do Feijão em Brumadinho/MG, colocou, todavia, em xeque tal modelo de licenciamento ambiental vigente.

O licenciamento brasileiro – essencialmente técnico-burocrático – tem sido alvo de críticas ao longo dos anos por, supostamente, afugentar empreendedores e prejudicar o ambiente de negócios. Apesar de documento obrigatório, o certificado de licença vinha sendo apresentado como um verdadeiro troféu diante de suas dificuldades, fortalecendo o branding da empresa licenciada no mercado.

Em oposição às críticas negativas, seus defensores sempre alardearam que a sua característica complexa, inclusive com uma instância decisória colegiada em Minas, era imprescindível para a tutela do meio ambiente e a segurança da coletividade. Para alguns, Minas Gerais estaria à frente de seu tempo.

Apenas a título de exemplo, o último licenciamento ambiental referente a Mina do Córrego do Feijão de Brumadinho/MG, que fora deferido pelo órgão ambiental mineiro em dezembro de 2018, possuía um conteúdo superior a 3.400 páginas e 8(oito) pastas de documentos, segundo relatório de vistas de 30/11/2018, apresentado em reunião do Conselho Estadual de Política Ambiental. Aludido relato consta disponível na internet, no site da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

O volumoso processo acima, citado como exemplo, não é exceção. Na verdade, os empreendimentos de mesma classe, porte e potencial poluidor, passam – em tese – por rigorosos estudos de impacto ambiental, somando inúmeras páginas de documentos e informações complementares. São incontáveis horas de análise por diferentes técnicos. Os requerimentos tramitam perante órgãos distintos, inclusive para instruir o arcabouço documental que será, ao final, apreciado pelo Conselho de Política Ambiental.

Com todo respeito à memória daqueles que conceberam o licenciamento ambiental no Brasil, esse modelo complexo e burocrático não acompanhou as exigências do “mundo da vida”. Como se sabe, a revolução tecnológica global apresenta inovações diárias nos processos produtivos e em seus sistemas de controle, sendo possível melhor mensurar/minorar, a cada dia, os reais impactos das atividades, prever riscos e até mesmo monitorar/fiscalizar à distância os empreendimentos.

A natural morosidade e a análise cartesiana do licenciamento, no mundo atual, não traduzem razoabilidade e proporcionalidade, tanto pelo que se exige em face da iniciativa privada, quanto pelo que se é efetivamente assegurado pela fiscalização do Poder Público à coletividade.

Aqueles que vivenciam a rotina dos processos de licenciamento conhecem bem a sua lógica burocrática weberiana. Há uma sucessão de atos submissos à termos de referência e parâmetros pré-estabelecidos por normas administrativas. Em alguns casos, o empreendedor torna-se refém de uma parte inútil do procedimento para o controle de sua atividade, enquanto o agente público apoia-se no princípio da legalidade para reprimir as críticas. Comenta-se que há casos de mera repetição de conteúdo de estudos técnicos de outros empreendimentos, quase um “copiar e colar”, na linguagem vulgar, para atender os aludidos termos de referência.

É evidente que, diante do atual retrato do licenciamento, um sistema de algoritmos (nada tão excepcional) seria capaz, por exemplo, de identificar o cumprimento das normas aplicáveis, a viabilidade ambiental do empreendimento e, finalmente, recomendar o seu deferimento, estabelecendo condicionantes ou exigindo correções pelo empreendedor. Sem desvio de finalidade e em poucos minutos.

Pergunta-se: As falhas de análise ou de elaboração dos estudos ambientais apresentados nos licenciamentos tem sido alvo de controle e responsabilização direta de agentes públicos ou técnicos da iniciativa privada? As inúmeras horas despendidas no licenciamento ambiental (que chega a durar mais de doze meses em alguns casos), não seriam mais úteis se direcionadas para uma espécie de controle preventivo/repressivo, durante a implantação e operação dos empreendimentos? Uma instância decisória colegiada, formada em alguns casos por membros leigos, seria suficiente para a segurança do meio ambiente? Infelizmente, as respostas estão estampadas nas páginas dos jornais.

Algumas das mazelas do licenciamento ambiental foram expostas em Brumadinho. A despeito do que se está a apurar em tal caso e sem fazer qualquer mínimo juízo sobre a conduta de qualquer dos envolvidos, restou cristalino que o licenciamento atual não é instrumento suficiente para a segurança do meio ambiente e da coletividade em geral, inclusive dos titulares dos empreendimentos. O modelo atual sofre de doença crônica e precisa ser reinventado.

ABURACHID, Frederico José Gervasio. Licenciamento Ambiental em xeque. Belo Horizonte, 2019.

*Sobre o Autor: Advogado. Mestre em Direito pela UFMG e em Sustentabilidade socioeconômica ambiental pela UFOP. Pós-graduação em Direito Ambiental.

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